Basta uma personagem na novela da Globo usar esmalte azul para encontrarmos na semana seguinte milhares de mulheres de todas as classes sociais usando esmalte azul. Esse mimetismo já é bem conhecido, mas podemos pensar além dos produtos: que comportamentos são introduzidos na sociedade a partir de uma novela? Que peso tem um autor, diretor e ator de novela para mudar o mundo?
Um artigo acadêmico publicado em 2008 por Eliana La Ferrara, Alberto Chong e Suzanne Duryea com o título Soap Operas and Fertility: Evidence from Brazil, estudou a fundo a relação entre novelas e a diminuição no número de filhos na família brasileira.
O estudo analisou somente as novelas da Rede Globo e cobriu o período de 1970 a 1991. Descobriu que as mulheres que viviam nas áreas com sinal da Globo tiveram uma queda muito forte na fertilidade. O impacto é mais forte nas pessoas de condição social mais modesta e nas mulheres acima de 30 anos. Demonstra também que foram as novelas e não os programas de televisão que influenciaram a mudança no comportamento da família.
Pesquisando a estrutura das novelas, o estudo descobriu que as famílias que aparecem nas tramas tinham muito menos filhos do que a família real brasileira.
Enquanto o país tem um nível de ensino muito rudimentar (basta pensar que 34% dos universitários brasileiros não possuem um grau pleno de alfabetização funcional), 90% dos lares tem uma televisão. Enquanto o ano letivo tem 200 dias (na teoria), as novelas ocupam mais de 300 dias.
A taxa de fertilidade por mulher no Brasil teve a queda mais acentuada no mundo, ultrapassando a da China (onde o governo introduziu a política do filho único, a esterilização e o aborto compulsório). Em 1960 havia 6,3 filhos por mulher no país; em 1970 havia 5,8; em 1991 apenas 2,9. Atualmente, em boa parte do nosso território, já estamos abaixo da taxa de reposição que é 2,1.
O perfil de 115 novelas da Globo indica que 72% dos principais personagens femininas, com idade inferior a 50 anos, não tinham nenhum filho. Sendo que as outras 21% tinham apenas 1 filho. Se consideramos apenas as heroínas que estão casadas nas novelas da Globo temos que 41,2% não tem filhos; 33,3% tem apenas 1 filho e 20,1% tem 2 filhos. Isso distorce totalmente a realidade.
Para piorar, a heroína além de não ter filho é rica e feliz. Em 1994 um estudo com mulheres que assistem novelas pediu que elas descrevessem a típica família que aparece na tevê e a típica família brasileira. Essas mulheres responderam que a família na novela é pequena, rica e feliz; a família real é maior, tem mais filhos e tem cara mais triste.
A influência, logicamente, não se atém ao número de filhos. Vai para o casamento, divórcio e traição. O estudo contabilizou que apenas 27% das heroínas das novelas com 50 anos ou menos são casadas e 12% são divorciadas ou separadas (deve-se ter em conta que isso cobre um período anterior a lei do divórcio e ao crescente número de separações e coabitações). Das casadas, 42,3% traem seus maridos na novela.
Contar uma história é sempre a melhor forma de transmitir algo para as pessoas. Isso pode ser usado para o bem, ou como neste caso, para o mal.
Fonte: Do namoro aos filhos – O blog da família Gomes http://www.portaldafamilia.org/artigos/as-novelas-e-a-diminuicao-da-natalidade.shtml Publicado no Portal da Família em 12/07/2015