DEMOCRATISMO NÃO É LIBERALISMO

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Antonio Paim

(Excertos de sua obra Curso de Humanidades 2)

A experiência inglesa

O democratismo corresponde a uma corrente política que em muitos casos tem sido confundida com o liberalismo. A confusão advém do fato de que, no momento em que o democratismo faz sua aparição, durante a Revolução Francesa, a experiência liberal estava circunscrita à Inglaterra e não tinha propósitos democratizantes. Em sua primeira fase, o liberalismo tratou de consolidar o governo representativo, em oposição à monarquia absoluta. Estabelecia, então, como condição fundamental para tornar-se eleitor (ou representante) a posse de certos bens que assegurassem uma posição independente diante do Estado. A luta em prol de um sistema que se regesse segundo leis de todos conhecidas exigiu grande tenacidade de parte da liderança liberal e impôs um sem número de sacrifícios. A elite proprietária estava disposta a correr tais riscos, livrando-se em troca da ameaça de tudo perder pelo simples arbítrio do Monarca.

O governo representativo configurou-se durante uma prática prolongada. A experiência é que sugeriu a separação e a autonomia dos diversos poderes. O relacionamento entre o Parlamento e o governo foi fixado após a alternância de muitos governantes, e que deu base à identificação daquilo que independia dessa ou daquela personalidade. As questões consideradas eram muito concretas, como por exemplo a imposição de que os impostos seriam votados anualmente (…).

O romantismo rousseauniano

Rousseau e o romantismo | Esquerda
Rousseau

O espaço de liberdade frente à onipotência estatal foi sendo conquistado paulatina e sucessivamente. Enquanto isto, no continente europeu, no mesmo período,  isto é, no século XVIII, havia sobretudo teorizações deduzidas de circunstâncias inteiramente idealizadas. Veicularam-se doutrinas de nítido cunho romântico, difundindo a crença que o homem era bom por sua própria natureza. Estragava-o a sociedade, sobretudo a falta de liberdade. Formulação mais ou menos acabada de tais idealizações seria de lavra de Jean Jacques Rousseau (1712-1778). Coube-lhe estabelecer o denominado princípio da vontade geral, isto é, a tese de que o homem, se chegasse a encontrar uma sociedade onde estivesse a salvo de toda arbitrariedade, a vontade que daí emergisse seria eminentemente moral e digna de melhor acolhida.

Na sociedade idealizada por Rousseau, a vontade geral é interpretada por um homem sábio que esteja acima das paixões e dos egoísmos. As leis tenderiam a alcançar uma espécie de perfeição absoluta. Ao governo não caberia legislar mas expedir os decretos requeridos pela execução das leis. Nesse sistema não há nem democracia direta nem poderes legislativo e executivo autônomos.

No sistema de Rousseau tampouco há lugar para o indivíduo. Enquanto o governo representativo tratava de disputar ao Estado um lugar cada vez mais amplo para os indivíduos, o projeto de Rousseau consistia em sufocar essa dimensão.

(…)

Democracia ou Democratismo

(…). no estado de Rousseau não há lugar para a tolerância. Devem ser fixados os dogmas indispensáveis à vida civil e os que não se submetem podem ser banidos e desterrados.

O democratismo na Revolução Francesa: processo gradual para o totalitarismo

“A Revolução Francesa pôs em circulação o protótipo do democratismo, que depois viria a ser aplicado a outras situações.

Num primeiro momento, os revolucionários encarnam a virtude. Expressam a vontade geral. Encontram-se num plano puramente moral não conspurcado por qualquer egoísmo subalterno.

No momento seguinte, toda oposição é logo rotulada de impatriótica. Assim, o grupo que se supõe a própria encarnação da virtude deve, no mais curto prazo, alcançar o monopólio da força. Do contrário corre o risco de ser ultrapassado por outro grupo qualquer que imagina possuir os mesmos títulos.

Revolução Francesa - Cantadas históricas - Cantadas

O democratismo é levado inexoravelmente a dar o passo seguinte e admitir a necessidade de “purificação” do processo. Da premissa de que “todos são bons”, passa-se á identificação dos “bons” com os próximos acólitos. A guilhotina da Revolução Francesa – e os batalhões de fuzilamento em outros movimentos – incumbem-se do resto. Sintetizando esse processo no livro Animal Farm, Orwell diz que o princípio de que “todos são iguais” exige de pronto uma complementação que formula deste modo: “todos são igual mas alguns são mais iguais do que os outros”.

Os iluminados que sabem precisamente o que o povo quer acabam por estabelecer abertamente uma ditadura. Em relação às situações vigentes sob o autoritarismo, muda apenas a retórica. A privação da liberdade atinge tão-somente “os inimigos do povo”.

Nota: os subtítulos e as partes em negrito são destaques do Olivereduc.com

Bibliografia: PAIM, Antonio. Curso de Humanidades 2 – política: guias de estudo/Antonio Paim, Leonardo Prota, Ricardo Vélez Rodriguez. – Londrina: Ed. UEL: Instituto de Humanidades, 2000, p. 167-168.

É uma excelente obra. Você pode acessá-la gratuitamente. https://www.passeidireto.com/arquivo/20149641/instituto-humanidades-2-liberalismo-antonio-paim-leonardo-prota-ricardo-velez-ro/7

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