Pe. Francisco Faus
10/07/2010
Leio na Folha de São Paulo de 9 de julho de 2010 (pág. A3), sob o título “Divórcio”, a crítica indignada de uma leitora de Indaiatuba ao artigo de Ives Gandra, publicado na mesma Folha (”Cotidiano” de 8 de julho) e intitulado “O divórcio relâmpago fragiliza ainda mais a família”. A missivista declara que o autor do artigo está desatualizado: “Informo que a sociedade mudou, hoje pais dividem a guarda dos filhos com suas mães e têm maiores condições emocionais e psicológicas de trazer aos filhos o que, de fato, significa um bom relacionamento. Os filhos não se privam do carinho e do amor de seus pais simplesmente porque estes resolvem tentar ser felizes num relacionamento pleno e satisfatório”.
A missivista quer informar o desavisado articulista. Acontece que eu também tenho alguma coisa a informar. Faz mais de quarenta anos que trabalho, de modo habitual, na orientação e apoio de estudantes, moças e rapazes, entre 12 e 25 anos de idade. Vários milhares de adolescentes e jovens já me contaram as suas alegrias, tristezas, ideais e lutas. Tenho, assim, apalpado diariamente “a vida como ela é”, por isso, tenho podido conhecer os efeitos do divórcio nos filhos: “na veia”, não em livros de sociologia ou psicologia.
Essa longa e vasta experiência me dá condições de afirmar, com conhecimento de causa, que em noventa por centro – pelo menos – dos casos, o divórcio dos pais causou nos filhos um trauma duradouro, provocando-lhes desorientação, amargura e, não raramente, distúrbios psíquicos. Sei que isto é verdade, mas sei também que, nos convencionalismos atuais, não há nada tão politicamente incorreto como a verdade.
Nunca me esquecerei da conversa com uma menina, estudante de colégio, que sofria com a separação dos pais. Ela teve oportunidade de ler os Manuscritos Autobiográficos de Santa Teresinha. Ficou deslumbrada com o ambiente de união e carinho familiar que transparece em cada página dessa autobiografia. Pouco depois da leitura do livro, disse-me com voz impregnada de tristeza: – “Padre, como era linda a família de Santa Teresinha! Eu acho que uma filha de pais separados nunca poderá ser santa…”. Ao ouvir isso, senti um sobressalto, uma punhalada no coração, e respondi-lhe com veemência: – “Claro que poderá, minha filha! Estou certo de que você, com a ajuda de Deus, poderá vir a ser uma grande santa”.
Causa-me muita pena, à vista dessas experiências, ouvir pais de família – obcecados pelas dificuldades da vida -, falarem do seu “direito de serem felizes”, ainda que isso signifique deixar os filhos numa posição ambígua e quase sempre prejudicial. Creio que o mais belo “direito” do casal – como de todos nós, filhos de Deus -é o “dever” de lutar, de entregar-nos, de sacrificar-nos dando-nos cada vez mais para “fazermos felizes” os demais (a começar pelos filhos). E creio ainda que o egoísmo mais ou menos consciente do pai ou da mãe que, em grande número de divórcios, é o que os leva à separação, pode-se tornar facilmente num buraco negro onde se enterra a felicidade própria e a dos filhos.
Não quero nem posso julgar o drama da missivista de Indaiatuba. Seria leviano e injusto formular sobre ela um juízo negativo. Por isso, peço a Deus que a abençoe, que lhe conceda a felicidade que seja possível alcançar nesta terra, e que a ajude também a envolver seus filhos em sentimentos e manifestações de carinho tais, que compensem a privação de um lar unido.
Fonte: /www.padrefaus.org/10/07/2010