Valter de Oliveira
No último 27 de julho publiquei um artigo em meu blog claravalcister.blogspot.com no qual critiquei D. Helder por ter feito, em 1967, uma declaração afirmando que a Igreja precisava de um novo Lutero. Critiquei também a ala progressista que agora quer canonizar D. Helder e reproduzi artigo no qual expus vários aspectos da vida e do pensamento do reformador alemão. (1)
Hoje apresento aos amigos texto de Engels analisando um aspecto da Reforma: as guerras camponesas na Alemanha. O destaque é para a atuação de Martinho Lutero.
Os estudiosos da história sabem que o movimento reformista é elogiado pelos marxistas por ser tido como a primeira etapa da reforma burguesa. Nem por isso poupam as contradições de Lutero. É o que vemos no texto extraído do livro História Moderna através de textos. A introdução em itálico é dos autores (Marques/Berutti/Faria).
GUERRAS CAMPONESAS NA ALEMANHA
“Ao estourar a guerra camponesa, e isso em regiões onde príncipes e nobres eram na maioria católicos, Lutero procurou assumir uma atitude conciliadora. Atacou decididamente os governos. Eles é que seriam culpados do levante por suas opressões; os camponeses não estariam se levantando contra eles, mas Deus mesmo. O levante também seria ímpio e contrário ao Evangelho, era dito do outro lado. Finalmente, ele aconselhou a ambos os partidos que fizessem concessões e se reconciliassem amigavelmente.
(Diz Engels) “Mas o levante, apesar desses conselhos bem intencionados e reconciliadores, estendeu-se rapidamente, atingiu até regiões protestantes dominadas por príncipes, senhores e cidades luteranos e cresceu rapidamente para além da reforma “razoável”. Nas cercanias mais próximas de Lutero, Turíngia, a fração mais radical dos insurretos, sob o comando de Münzer, estabeleceu o seu quartel general. Mais alguns êxitos e toda a Alemanha estaria em chamas. Lutero estaria cercado, talvez executado como traidor, e a Reforma burguesa seria arrastada pela revolução camponesa-plebeia. Não havia mais o que pensar. Ante a revolução, todas as inimizades ficam esquecidas; em comparação com as hordas de camponeses, os servidores da Sodoma romana (2) eram inocentes cordeiros, mansos filhos de Deus; e burgueses e príncipes, nobres e padrecos, Lutero e o papa se uniram “contra as hordas assassinas de camponeses assaltantes”.
“É preciso despedaçá-los, degolá-los e apunhala-los, em segredo e em público, quem puder fazê-lo, como se tem de matar um cachorro louco!” gritava Lutero. “Por isso, prezados senhores, quem aí o possa, salve, apunhale, bata, enforque e, se morrer por isso, morte mais feliz jamais há de poder alcançar”.
“Nada de ter falsa piedade com os camponeses. Confundem-se a si mesmos com os insurretos aqueles que se apiedam daqueles a quem Deus mesmo não se apieda, mas que Ele quer ver punidos e perdidos. Depois, os próprios camponeses hão de aprender a agradecer a Deus se têm de entregar uma vaca para poderem usufruir a outra em paz (3); e os príncipes hão de conhecer, através da rebelião, qual é o espírito do populacho que só pode ser governado pela violência”.
Engels, Friederich. As guerras camponesas na Alemanha. Citado em Fernandes, Florestan. Marx/Engels. 2ª ed., São Paulo, Ática, 1984, p. 244-5.500 anos depois, o que dizem os bispos católicos alemães sobre Lutero?
Desde o Concílio vivemos uma época de ecumenismo. Através do diálogo procuramos curar as feridas do passado bem como restaurar a unidade cristã. Desejo saudável que, só será frutífero se for realmente baseado na caridade e fundamentado na verdade.
Acontece que há uma visão falsa do ecumenismo. Aquela que é defendida e propagada pelo progressismo. E este é fortíssimo na Alemanha. Progressismo que tem tido sucesso em destilar seu veneno em amplos setores da Igreja. Certas propostas feitas no Sínodo são exemplos claros disso.
Quanto a Lutero o episcopado alemão age como D. Helder. Nada a estranhar. São progressistas. Basta ver o novo relatório sobre as relações católicos e protestantes no qual dizem que o 500º aniversário da Reforma deve contar com o “arrependimento de ambos os lados”…
Claro que, com boa vontade, podemos achar uma boa explicação para a frase. Mas, outras afirmações vão deixar mais claro o pensamento dos bispos. Eles descrevem Lutero como um “desbravador religioso, um testemunho evangélico e mestre da fé”, cuja “preocupação pela renovação no arrependimento e na conversão” não recebeu uma “audiência apropriada em Roma”. (4)
Em outras palavras: a culpa maior foi nossa… E do Concílio de Trento!
Os problemas na Igreja, ao contrário do que certa mídia religiosa quer passar avolumam-se constantemente e os fundamentos dogmáticos e morais católicos estão sendo cada vez mais solapados. Lamentavelmente.
A Igreja de hoje não precisa de um novo Lutero. Aliás ela tem muitos. O que precisa é de um novo São Bernardo.
Notas:
1. Veja o artigo “Tem a Igreja o que aprender com Lutero?” aqui: https://claravalcister.blogspot.com.br/ Artigo de 12 de julho de 2016
2. Lutero costumava usar palavras grosseiras e obscenas para se referir à Igreja.
3. Quase 400 anos depois, no governo de Lenin, os camponeses russos vão ser obrigados a entregar toda a produção agrícola. Ele decretou a pena de morte para quem guardasse algo. Era o começo do governo dos camponeses e do proletariado…
4. site da unisinos. Os destaques em negrito são do site olivereduc.com. Basta ver como Lutero mandou exterminar os camponeses para vermos se ele foi “um testemunho evanélico”.
FONTES:
- História Moderna através de textos / seleção de Adhemar Martins Marques, Flávio Costa Berutti, Ricardo de Moura Faria. – 2ª edição, São Paulo: Contexto, 1990. p.126,127.
- http://www.ihu.unisinos.br/publicacoes/558837-martinho-lutero-foi-um-mestre-da-fe-dizem-bispos-alemaes