FERNANDO HENRIQUE E A DESCRIMINALIZAÇÃO DA MACONHA



Valter de Oliveira

 21/09/2009

No começo do ano a mídia noticiou que o ex-presidente FHC defendia a descriminalização  da maconha para uso pessoal. A sugestão, conforme ele, não significaria “tolerância”, mas saída para erradicação da droga…

A proposta, lamentavelmente, não é apenas a expressão de uma opinião pessoal. É também uma conclusão do relatório apresentado em 11 de fevereiro p.p. pela Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia, organização não-governamental que tem à frente os ex-presidentes do Brasil, Colômbia (César Gaviria) e México (Ernesto Zedilllo).

De acordo com a ONG, apesar dos grandes investimentos, a estratégia de “guerra às drogas”, que tem ênfase na repressão à produção e na criminalização dos usuários, não tem obtido sucesso.

O ex-presidente Fernando Henrique explicou que a sugestão de descriminalização não significa “tolerância”“Reconhecemos que a maconha tem um impacto negativo sobre a saúde. Mas inúmeros estudos científicos demonstram que o dano causado por esta é similar aos do álcool e do tabaco”, disse. Ele admite que o ponto é polêmico, mas defende a discussão. “Precisamos quebrar o tabu que bloqueia o debate”, reforçou.

“A repressão propicia a extorsão dos consumidores e a corrupção da polícia”, diz o texto.

Segundo o relatório, os governos devem focalizar sua ação no combate à repressão sobre o crime organizado e devem também reavaliar a repressão sobre o cultivo.

Para o ex-presidente, as campanhas educativas para prevenir o uso das drogas deveriam seguir o modelo daquelas criadas para conter o consumo de tabaco.

As conclusões da comissão, formada também por intelectuais e representantes de diversos setores, devem ser apresentadas na próxima reunião das Nações Unidas (ONU), em março, em Viena, na Áustria. O encontro tem o objetivo de avaliar as políticas de drogas em todo o mundo.

E o ex-presidente resolveu virar garoto propaganda da genial idéia. Deu entrevista em Londres, ao The Guardian. Aproveitou para dizer que o presidente Obama tinha deixado “claro que a idéia da guerra contra drogas não funciona.”

Em março foi a Viena fazer sua apologia. Faziam parte da comissão os escritores Mario Vargas Llosa e Paulo Coelho. Esqueceram do Minc e do Gabeira…

Passaram-se alguns meses. Agora, nas páginas amarelas de Veja da semana passada, Fernando Henrique volta à carga. Transcrevo Reinaldo Azevedo que diz em seu blog na revista:

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso concede uma entrevista a Thaís Oyama (…) em que defende a descriminalização da maconha. Não preciso reiterar aqui a enorme admiração que tenho pelo intelectual e pelo presidente, manifestada em muitos textos. Mas, nesse caso, minha discordância não poderia ser mais radical. Considero que FHC está equivocado da primeira à última palavra. O leitor achará facilmente no arquivo os meus argumentos contrários à proposta. (1) Vou me ater, neste comentário, a alguns aspectos outros da entrevista que me incomodaram. Leiam este trecho:

O que as pessoas mais próximas do senhor no PSDB pensam sobre o assunto?

Eu nunca conversei com ninguém do PSDB sobre isso e quase posso assegurar que a maioria do PSDB pensa como o homem comum – e o homem comum tem horror de pensar nesse assunto. Mas, como se trata de um drama social, ou se toma consciência de que temos de fazer algo diferente do que temos feito, sem covardia e sem leniência, ou seremos irresponsáveis. Alguém tem de ter coragem de dizer essas coisas. Agora, certamente, o pessoal pode ficar chateado… Mas eu não sou candidato, sou só presidente de honra do partido.

Reinaldo comenta:

Essa história de que o homem comum não alcança certas altitudes do pensamento e, em último caso, não sabe o que é bom para si mesmo pode custar caro. Entre outras coisas, abre espaço para vigaristas que se apresentam justamente como intérpretes eficientes do pensamento do “homem comum”.

Ademais, a luta de FHC parece nova, mas, de fato, é muito velha. Já está ultrapassada. A realidade relativamente nova no continente sul-americano é a chegada ao poder de líderes populistas que estão se articulando com o narcotráfico e seus elos, transformando essa aliança numa espécie de Teoria e Prática da Remissão do Oprimido. Evo Morales, presidente da Bolívia, preferiu abrir mão de incentivos dos EUA para a agricultura e incentivar, pasmem!, a ampliação da área plantada de coca. E atenção: trata-se de um tipo particular da planta que serve basicamente para a fabricação de pasta de cocaína. Rafael Corrêa, presidente do Equador, está documentado, recebeu dinheiro das Farc. A Venezuela forneceu armamento para os narcoterrostistas da Colômbia. Os intermediários, também está documentado, foram dois generais venezuelanos, íntimos de Hugo Chávez, acusados de vínculo com o narcotráfico.

FHC escolheu a causa errada. A sua insistência no assunto só servirá à caricatura.

Reinaldo tem toda a razão.

Termino com duas observações.

1. “Nunca conversei com ninguém do PSDB sobre isso”, diz o ex-presidente. Um tema como esse não é debatido em um partido? Não é grave assunto de segurança pública? Santo Deus!  Está aí um exemplo claro do que falo em outro artigo sobre nossos partidos, seus ideais e seus programas. E nosso intelectual ainda é tido por estadista!

2.A proposta pretensamente racional, séria, da intelectualidade da esquerda não encontra guarida nos meios especializados. Graças a Deus.

Foi em nosso país que o novo representante do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODOC), agência da ONU, Bo Mathiasen afirmou, em pleno Palácio do Planalto, que “o álcool e o tabaco causam mais mortes justamente porque são legais”. É a conclusão do relatório da ONU, de 313 páginas, lançado recentemente em Washington.

Roberto Filho, diretor de Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal confirma:

“A experiência tem demonstrado e nos habilita a dizer que uma eventual liberação, mesmo de drogas consideradas leves, como a maconha, estimularia o consumo. E, como seria submetida a controles sanitários e impostos, não eliminaria a produção ilícita por organizações criminosas”

Fatos e argumentos convencerão ou sensibilizarão a “intelectualidade” de esquerda?

Duvido. Como disse Raymond Aron o marxismo é realmente “o ópio dos intelectuais”.

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